Lava-pés
é um rito religioso observado por diversas denominações cristãs e é baseado no
relato de João 13.1-17, que menciona Jesus realizando-o durante a Última Ceia.
A cerimônia é realizada na Quinta-Feira Santa da Semana Santa.
A
origem da prática pode estar nos costumes referentes à hospitalidade das
civilizações antigas, especialmente naquelas onde a sandália (um calçado
aberto) era o principal tipo de calçado. O anfitrião, ao receber um hóspede,
providencia uma vasilha com água e um servo para lavar-lhe os pés. Este costume
aparece em diversos pontos do Antigo Testamento (veja, por exemplo, Gênesis 18.4;
19.2; 24.32; 43.24; 1 Samuel 25.41, entre outros), e também em outros
documentos históricos e religiosos. Um típico anfitrião da região geralmente se
curvava, beijava o hóspede e então oferecia a água e o servo para a lavagem dos
pés. O costume também valia quando o hóspede usava sapatos como uma forma de cortesia.
No trecho em 1 Samuel aparece pela primeira vez o ato de alguém realizar a
lavagem como prova de humildade. Em João 12,
Maria de Betânia ungiu os pés de
Jesus presumivelmente para agradecer-lhe por ressuscitar seu irmão Lázaro dos
mortos.
A
Bíblia relata a lavagem dos pés de santos sendo praticada pela igreja antiga em
1 Timóteo 5.10, provavelmente como sinal de piedade, submissão ou humildade.
NARRATIVA
BÍBLICA
As
denominações cristãs que observam o lava-pés o fazem com base no exemplo e
comando dado por Jesus no Evangelho de João:
“Antes da festa da
Páscoa, sabendo Jesus que era chegada a sua hora de passar deste mundo ao Pai,
tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim. Durante a ceia,
como o Diabo havia já posto no coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, que
traísse a Jesus, sabendo este que o Pai tudo pusera nas suas mãos, e que saíra
de Deus e ia para Deus, levantou-se da mesa, tirou as suas vestes e, tomando
uma toalha, cingiu-se; depois deitou água na bacia e começou a lavar os pés aos
discípulos e a enxugar-lhos com a toalha com que estava cingido. Chegando a
Simão Pedro, perguntou-lhe este: Senhor, tu a mim me lavas os pés?
Respondeu-lhe Jesus: O que eu faço, tu não o sabes agora, mas entendê-lo-ás
mais tarde. Disse-lhe Pedro: Não me lavarás os pés jamais. Replicou-lhe Jesus:
Se eu não te lavar, não tens parte comigo. Disse-lhe Simão Pedro: Senhor, não
somente os meus pés, mas também as mãos e a cabeça. Declarou-lhe Jesus: Aquele
que já se banhou, não tem necessidade de lavar senão os pés, porém está todo
limpo; e vós estais limpos, mas não todos. Pois ele conhecia aquele que o havia
de trair; por isso disse: Não estais todos limpos. Depois de lhes ter lavado os
pés, tomou as suas vestes e, pondo-se de novo à mesa, perguntou-lhes:
Compreendeis o que vos tenho feito? Vós me chamais Mestre, e Senhor, e dizeis
bem; porque eu o sou. Se eu, pois, sendo Senhor e Mestre, vos lavei os pés,
também vós deveis lavar os pés uns aos outros;porque vos dei exemplo, a fim de
que, como eu fiz, assim façais vós também.” (João 13.1-15).
Jesus
demonstrou o costume da época quando ele comenta sobre a falta de hospitalidade
na casa de um fariseu que não providenciou água para a lavagem dos pés no
episódio conhecido como Parábola dos Dois Devedores (Lucas 7.44).
História
É
possível que o ritual do lava-pés já fosse praticado durante a era apostólica,
embora as evidências sejam escassas. Tertuliano (145–220), por exemplo,
menciona a prática em sua obra "De Corona", mas não oferece detalhes
sobre quem a praticava ou como. O ritual também era praticado na Igreja de
Milão (cerca 380), foi mencionado durante o Concílio de Elvira (300) e por
Agostinho de Hipona (cerc. 400). A observância do lava-pés na época do batismo
era mantida na África, Gália, Mediolano, no norte da Itália e na Irlanda. De
acordo com a "Enciclopédia Menonita", a "Regra de São
Bento" (529), utilizada pela Ordem dos Beneditinos, prescreve a lavagem
dos pés para os hóspedes além da lavagem comunal como forma de humildade. Aparentemente
o costume foi iniciado pela Igreja de Roma, ainda que não relacionado com o
batismo, por volta do século VIII. Os albigenses observavam o costume, ligado à
Comunhão, e o costume dos valdenses era lavar os pés dos ministros quando em
visita. Há evidências que o costume também era observado pelos hussitas.
Prática
católica romana
Na
Igreja Católica Romana, o ritual da lavagem dos pés é atualmente associada com
a Missa da Última Ceia, que celebra de maneira especial a Última Ceia de Jesus,
na Quinta-Feira Santa. Evidências da prática neste dia remontam pelo menos o
século XII, quando "o papa lavou o pé de doze subdiáconos após sua missa e
de treze pessoas pobres após sua ceia."
De
1570 a 1955, o Missal Romano trazia, após o texto da missa da Quinta-Feira Santa,
um rito de lavagem dos pés não relacionado com a missa. A revisão de 1955 pelo
papa Pio XII inseriu-o na missa. Desde então, o rito é celebrado após a homilia
que segue a leitura do evangelho — com o trecho referente à lavagem realizada
por Jesus em João. Alguns homens pré-selecionados — geralmente doze, mas o
missal não prescreve um número — são conduzidos até cadeiras preparadas para
cerimônia. O sacerdote, com a ajuda de ministros, derrama água sobre os pés de
cada um e os enxuga. Há alguma controvérsia, ou pelo menos uma variação na
prática, sobre se este ritual deveria incluir leigos e, se sim, se mulheres
deveriam ser excluídas.
Igreja
Ortodoxa e católicos bizantinos
A
Igreja Ortodoxa e as Igrejas Católicas Orientais realizam o Lava-pés também durante
a Quinta-Feira Santa de acordo com seus rituais. O serviço pode ser realizado
tanto pelo bispo lavando os pés de doze sacerdotes ou por um hegúmeno (abade)
lavando os pés de doze membros da irmandade em seu mosteiro. A cerimônia é
realizada ao final da chamada Divina Liturgia.
Após
a Santa Comunhão, os irmãos seguem em procissão para o local da lavagem dos pés
(que pode ser o centro da nave, no nártex, ou do lado de fora). Após um salmo e
alguns troparia (hinos), uma litania (ektenia)
é recitada e o bispo ou hegúmeno leem uma oração. Então o diácono faz a leitura
do Evangelho de João, enquanto o clérigo faz o papel de Cristo e seus apóstolos
conforme o bispo ou hegúmeno recita as palavras de Jesus. Então o próprio bispo
ou hegúmeno conclui a leitura do evangelho, faz uma nova oração e asperge os
presentes com a água utilizada na lavagem. A procissão então retorna para a
igreja para que a despedida seja realizada normalmente.
Ortodoxos
orientais
O
rito do Lava-pés também é observado pelas igrejas ortodoxas orientais durante a
Quinta-Feira Santa. Na Igreja Ortodoxa Copta, o serviço é realizado pelo padre
paroquial e não apenas por um bispo ou hegúmeno. Ele abençoa a água com a cruz,
exatamente como ele faz para benzer água benta e lava os pés da congregação
inteira.
Na
Igreja Ortodoxa Síria, este serviço é realizado apenas pelo bispo e de forma
bastante cerimonial, pois ele acontece no meio da leitura do evangelho
(evangelion). Doze pessoas pré-selecionadas, leigos e clérigos, são colocadas
no local da cerimônia e o bispo lava as mãos e beija os pés dos doze. Em
seguida, o mais antigo dos padres lava os pés do bispo, demonstrando que o rito
não é uma mera dramatização do evento passado. Finalmente, é feita uma oração
através da qual a congregação toda lava e se limpa de seus pecados.
Práticas
protestantes ou reformadas
O
ritual do Lava-pés é observado por diversos grupos protestantes e reformados,
incluindo a Igreja Adventista do Sétimo Dia, os pentecostais e os grupos
pietistas, alguns anabatistas e diversas denominações batistas.
Além
disso, observam o rito também os anglicanos, luteranos e metodistas, geralmente
na Quinta-Feira Santa e, em alguns casos, na cerimônia de ordem na qual o bispo
pode lavar os pés dos recém-ordenados sacerdotes. Embora a história mostre que
o Lava-pés tenha sido por vezes realizado juntamente com o batismo e, por
vezes, como uma cerimônia separada, ele é majoritariamente celebrado ligado ao
serviço religioso da Última Ceia.
Entre
os grupos e denominações que não observam o Lava-pés como mandamento ou como
ritual, o exemplo de Jesus é geralmente celebrado como simbólico e didático.
Entre estes grupos, o Lava-pés é, ainda assim, praticado em algumas ocasiões.
Alguns como forma de hospitalidade ou necessidade. Outros, como uma lição
dramatizada perante a congregação.
Outras
Para
a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias (mórmons), o fundador, em
meados da década de 1830, instituiu o mandamento do Lava-pés nos templos como
uma ablução ritual. A prática foi depois expandida para uma cerimônia de
lavagem e unção, que inclui uma lavagem dos pés.
A
Verdadeira Igreja de Jesus pratica o Lava-pés como um sacramento baseado no
Evangelho de João. Como os outros dois sacramentos, o batismo e a ceia do
Senhor, membros desta igreja acreditam que o Lava-pés concede graça salvadora
ao recipiente — neste caso, uma parte de Cristo (João 13.8).
A
maior parte das denominações da Igreja de Deus também incluem a cerimônia.
Por
fim, as congregações adventistas do sétimo dia agendam uma oportunidade para
lavagem dos pés antes do serviço da Comunhão quatro vezes por ano. Em linha com
sua comunhão "aberta", todos os fiéis presentes, não apenas os
membros ou pastores, são convidados a partilhar da lavagem uns com os outros:
homens com homens, mulheres com mulheres e, por vezes, casais casados entre si.
Este serviço é chamado também de "Mandamento da Lavagem dos Pés" ou
"Mandamento da Humildade". Seu objetivo principal é renovar a pureza
que vem apenas de Cristo, mas também buscar e celebrar a reconciliação com
outros membros da Ceia do Senhor.
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