Cristo nos ensinou a orar: “Perdoa-nos as nossas dívidas como nós perdoamos aos nossos devedores”. O que isso significa? O que queremos dizer quando falamos em perdoar pessoas e sermos perdoados?
O
perdão refere-se à eliminação de barreiras que impedem relacionamentos
pessoais, barreiras que foram levantadas quando um relacionamento foi
prejudicado pelo erro
consciente de alguém. Isso não significa tratar o erro
como coisa sem importância, nem fazer de conta que nunca aconteceu. Antes
reconhecendo o erro como erro, quem perdoa age evitando que o relacionamento
continue prejudicado por seus próprios ressentimentos ou pelo fardo da culpa de
quem errou. O perdão flui apesar do amor,
não por causa do amor.
Jesus
contou a história de um servo que havia feito séria dívida com o seu senhor e
recebeu ordens de se desfazer de todas as suas propriedades para pagar. Em
resposta ao pedido do servo, entretanto, o senhor compassivamente relevou a
dívida e reintegrou o servo. Quando as pessoas perdoam alguém, reagem ao erro
indo além do que a justiça restrita ou a razão podem ditar; elas agem com graça
pura.
“Perdoa-nos
os nossos pecados”
Na
Bíblia, muitas das referências ao perdão dizem respeito a Deus perdoando os
pecados de pecadores. Quando Deus perdoa e nós recebemos seu perdão, o pecado
fica coberto e é eliminado (duas palavras do Antigo Testamento (AT) traduzidas por
perdoar). Os bons relacionamentos
podem então ser restaurados entre nós e Deus.
Alguns
dos sinais do perdão de Deus, de acordo com o entendimento bíblico, são os
seguintes:
Não há nada
automático no perdão. É um sinal do caráter amoroso e cheio de graça de Deus,
que é apresentado em certo lugar como um
Deus de perdões. O pecado merece castigo, mas o perdão vai além da justiça
restrita, e Deus, misericordioso e cheio de graça, demonstra misericórdia a
milhares.
O perdão é recebido
apenas pelo penitente. O espírito perdoador de Deus faz parte de sua natureza,
mas a experiência de ser perdoado está ao alcance apenas dos dispostos a mudar
sua mente e intenção para com Deus, que desejam livrar-se do pecado e partilhar
de um relacionamento restaurado com Ele. Esse é o tema da oração de confissão
de Davi no salmo 51. Ele havia cometido uma série de erros, e nesse salmo está
expressado dolorosamente sua humildade diante de Deus, reconhecendo que seus
erros contra os outros foram de fato também pecados cometidos diante de Deus, e
então fazendo confissão. Ele anseia por receber um coração novo e almeja louvar a Deus e colocá-lo em primeiro lugar.
Receber
perdão nos custa o orgulho, lembra-nos da nossa dependência de Deus e envolve
reconhecimento de que estamos errados. Quando o AT diz que o culpado não tem por inocente, quer dizer que é apenas por meio do
arrependimento que podemos receber o perdão cheio de graça de Deus.
O perdão também custa
caro a quem perdoa. Uma das palavras do AT que significa perdoar está relacionada com a ideia central do sistema sacrifical
do AT de fazer expiação: a maneira de Deus ficar “quite” com seu povo.
No
Novo Testamento (NT), vemos quanto custou a Deus perdoar-nos quando vemos que,
para sermos perdoados, Jesus Cristo precisou morrer. Paulo, em sua carta aos
efésios, escreve que temos “a redenção pelo seu sangue, e remissão dos
pecados, segundo as riquezas de sua graça que ele derramou profundamente sobre
nós”.
Podemos
ser perdoados porque Cristo morreu em nosso lugar para reconciliar-nos com
Deus.
O perdão não restaura
apenas um relacionamento, ele o intensifica. Lembra-se do que aconteceu quando
o filho pródigo voltou para casa? A parábola de Jesus (Lucas 15:11-32) mostra
como o perdão não é apenas um termo legal voltado para o passado, mas abre
caminho para uma vida mais rica de filiação no futuro.
O perdão é às vezes
ligado à cura. Uma das palavras do NT traduzida por perdão significa descartar,
centralizar-se na eliminação de barreiras à comunhão.
Essa
é a palavra utilizada na história do encontro de Jesus com o paralítico. Quando
Ele viu a fé dos quaro amigos que baixaram o doente com sua cama no recinto
onde Ele estava pregando, disse ao paralítico: “Meu filho, perdoados te são os
teus pecados”.
As
barreiras, espirituais e físicas, que nesse caso estavam impedindo que o homem
vivesse livremente diante de Deus, foram retiradas por meio do ato de amor de
Cristo. Não significa que a enfermidade esteja sempre ligada a determinado
pecado. Mas às vezes o pecado produz sofrimento emocional ou físico, que é
eliminado quando as pessoas sabem que são perdoadas por Deus.
“Como
nós perdoamos aos outros”
As
trágicas sequelas da história do servo com a enorme dívida e o seu senhor é que
o servo se recusou a perdoar a um dos seus colegas que lhe devia a insignificante
quantia de cinco centavos (veja Mateus 18:21-35). Jesus mostra que o homem não
tinha compreendido verdadeiramente o que significa ser perdoado. Na verdade,
receber perdão quando somos realmente penitentes pelo erro que cometemos
deveria evidenciar-se no nosso perdão para com os outros que erraram contra
nós.
Precisamos
lembrar-nos de que esquecer faz parte do perdoar e que o perdão não está completo até que o erro seja “deixado de lado” e
finalmente esquecido. O meigo espírito de
perdoar do NT é bem diferente do tipo de perdão que às vezes oferecemos aos
outros. Podemos com demasiada facilidade esquecer do aspecto perdoador e
apegar-nos a ressentimentos internos, por mais que declaremos o perdão
exteriormente.
Uma
das tarefas-chaves que os cristãos têm é proclamar o evangelho do perdão. Uma
maneira de fazê-lo é sendo membros da comunidade
do perdão – a igreja. Outra é
buscando o padrão divino explícito de perdão em todos os relacionamentos. Faz
parte do significado de amor a maneira em que o amor é expresso em situações de
erros pessoais.